Prof. Dr. Dinair Andrade da Silva.

Estas campinas verdes e humosas que pisamos, estas florestas virgens que se patenteiam às nossas vistas, ricas de seiva produtora, desejando ostentar sua fertilidade, o calor de seus caules seculares, esses mananciais, que as ornam e as fecundam com a sua água cristalina, este ar puro e fartamente oxigenado pela função clorofiliana dos vegetais que nos rodeiam, livres, em uma altitude de 780 metros, tudo nos leva a bendizer a empreitada que tomamos a ombros e que se nos afigura tão grandiosa como este horizonte belíssimo, que se descortina a perder de vista, em uma amplitude de mais de trinta quilômetros.

Discurso pronunciado por Pedro Ludovico na solenidade de assentamento da pedra fundamental de Goiânia, em 24 de outubro de 1933. In TEIXEIRA, P. L. Memórias, p. 102.

Em espaço tão exíguo não se fará mais que apresentar, de maneira esquemática, o perfil biográfico deste goiano ilustre e sua inserção no contexto histórico pertinente, e colocar à disposição do leitor interessado algumas indicações para leitura.

Pedro Ludovico nasceu na cidade de Goiás, em 23 de outubro de 1891, e faleceu em Goiânia, em 16 de agosto de 1979.

Na cidade em que nasceu, viveu aventuras e sonhos de criança: as brincadeiras, os amigos, o rio Vermelho, a Escola de Mestra Nhola. O Liceu de Goiás ofereceu os subsídios intelectuais necessários à conquista de novos horizontes.

Aos 18 anos, foi para o Rio de Janeiro. Lá constatou a existência de outro mundo: o do litoral, de tempo muito veloz, que se contrapunha ao do interior, de tempo lento em transcorrer. Deslumbrou-se, naturalmente, com o novo: Teatro Municipal, Confeitaria Colombo, Biblioteca Nacional, Bar da Brahma, Clube Naval, cinemas e muita gente se deslocando de um lado para outro.

É fácil perceber a ambiguidade que se criava na mente, sentimentos e atitudes de um jovem que partia do interior para a capital do país: a modernidade e a estimulação intelectual em oposição à tradição e ao marasmo. Pedro Ludovico conviveu, por toda sua vida, com o conflito entre as concepções da vida interiorana e da vida no grande centro.

O Rio de Janeiro, nas primeiras décadas do século XX, em razão das novidades recebidas da Europa, e especialmente da França, tornou-se um espaço onde borbulhavam ideias de modernidade. A influência deste ambiente cultural marcou de maneira indelével a vida e a prática política de Pedro Ludovico.

Cursou a Faculdade de Medicina da Praia de Santa Luzia e realizou a sua residência médica no Hospital da Santa Casa. Nestes ambientes, pôde desfrutar da amizade e dos ensinamentos de mestres como Miguel Couto, Paes Leme e Miguel Pereira, os quais estimularam o entusiasmo do acadêmico goiano pela área da saúde.

Retornou ao Estado natal em 1916. Em decorrência do pedido de sua mãe a Eugênio Jardim, Presidente do Estado e pessoa aparentada à família, foi-lhe oferecido o emprego de médico da Força Pública Goiana. Recusando esta oferta de trabalho, o jovem médico optou pelo exercício da clínica na pacata cidade de Bela Vista. No ano seguinte, dirigiu-se para Rio Verde, onde exerceu a medicina de maneira mais metódica, porém sempre insatisfeito com a vida monótona das cidades do interior.

Casou-se, em 1918, com Gercina Borges Teixeira, filha do senador Antônio Martins Borges, comerciante e fazendeiro ligado à oligarquia dos Caiado. Dos cinco filhos do casal, Mauro Borges Teixeira destacou-se no exercício da política, exercendo os cargos de governador do Estado, senador e deputado federal.

Em 1919, participou da fundação do jornal O Sudoeste, instrumento de combate à oligarquia Caiado, então no poder em Goiás.

No final dos anos 1920, aderiu à Aliança Liberal, movimento político de oposição ao Governo Federal. Este movimento marcou a crise iniciada com o rompimento do acordo entre os Estados de São Paulo e Minas Gerais quando da sucessão do Presidente Washington Luís.

Distante dos grandes centros de decisão política, a oligarquia goiana mantinha seu apoio formal ao Presidente Washington Luís. Neste contexto, Pedro Ludovico, que liderava o movimento oposicionista no Estado, juntou-se aos mineiros da Aliança Liberal, que manifestavam franco apoio a Vargas.

Com a Revolução de 1930, Getúlio Vargas, Chefe do Governo Provisório, deu início à Segunda República, valorizando diversos setores da sociedade como os dissidentes rurais, a classe média emergente, os tenentes desfavorecidos, os industriais desprovidos de apoio político e econômico, entre outros.

O movimento revolucionário de outubro de 1930 explica o surgimento de revoltas em vários Estados do país. Inserido nesta conjuntura, Pedro Ludovico, retornando de Belo Horizonte onde foi em busca de apoio político, marchava rumo à cidade de Goiás, comandando uma coluna revolucionária composta de pouco mais de cem homens. O líder oposicionista foi preso pelas forças policiais do Estado nas imediações da cidade de Rio Verde.

No final de outubro, foi determinada a sua remoção para a capital pelo governo estadual. A notícia da vitória do movimento de 1930 surpreendeu o contingente policial que conduzia o prisioneiro. Pedro Ludovico, até então sob custódia da milícia, entrou vitorioso na cidade de Goiás. Com o apoio de um pequeno contingente, ocupou o Palácio Conde dos Arcos, sede do governo. Inaugurava-se, naquele momento, um governo que objetivava colocar fim ao ciclo do caiadismo e instaurar a modernidade em Goiás.

Integrou a Junta Governativa do Estado ao lado de Francisco Emílio Povoa e Mário de Alencastro Caiado.

Em 21 de novembro de 1930, foi nomeado, pelo Chefe do Governo Provisório, Interventor Federal no Estado de Goiás, permanecendo à frente do Executivo goiano durante o período em que Vargas governou o Brasil.

Pedro Ludovico empenhou-se em trazer a modernidade dos grandes centros brasileiros para o Estado de Goiás. Diferentemente de outros políticos, que compartilhavam com ele da idéia da transferência da capital no Estado de Goiás, estava imbuído de elementos do urbanismo francês que ele havia vivenciado nos seus tempos de estudante no Rio de Janeiro.

Nesse sentido, desde o início da sua administração começaram os preparativos para a transferência da capital para local mais apropriado. A partir de 1933, intensificaram-se os trabalhos da construção de Goiânia, que foi inaugurada em 1937.

A construção de Goiânia e a consequente transferência da capital para a nova cidade imortalizaram este político goiano. No entanto, entre as suas realizações políticas incluem-se, ainda, diversas obras relevantes como a rodovia que liga a nova capital do Estado à cidade de Rio Verde, a hidrelétrica Rochedo, destinada a fornecer energia elétrica para Goiânia, e a ponte sobre o rio Paranaíba, ligando os Estados de Goiás e Minas Gerais.

Eleito senador em 1945, Pedro Ludovico participou dos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte que elaborou a Constituição Federal de 1946.

Em 1950, retornou ao governo goiano, interrompendo seu mandato no Senado Federal. No ano de 1954, voltou ao Senado da República, onde permaneceu até 1969, quando foi cassado pelo Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968.

No transcorrer dos anos em que foi parlamentar, atuou, no âmbito nacional, em comissões de Saúde Pública, Agricultura, Legislação Social e Finanças. No exterior, foi membro do Conselho da União Interparlamentar em Varsóvia e integrou a delegação do Brasil na reunião do Acordo Geral de Tarifas Aduaneiras e Comércio (GATT).

Faz-se necessário ressaltar que, no período entre 1957 e 1960, esteve ao lado do Presidente Kubitschek na luta pela construção e transferência da capital federal para Brasília. Neste sentido, é válido mencionar dois pontos da maior relevância: a experiência mudancista que Pedro Ludovico acumulara foi, com certeza, partilhada com o Presidente da República, e a clara percepção que o dinâmico político goiano tinha do significado da interiorização da capital da República para o progresso do país, e de modo específico, para o progresso do Estado de Goiás.

Em novembro de 1964, atuou com energia na defesa da legalidade no seu Estado, no momento em que o governador perdia o mandato por meio de uma medida de exceção.

Impedido compulsoriamente do exercício de funções políticas, Pedro Ludovico dedicou-se mais efetivamente às atividades intelectuais. Integrou os quadros da Academia Goiana de Letras, redigiu suas memórias, pronunciou conferências, entre outras atividades.

Em 1979, aos 88 anos de idade, com lucidez e destemor, manifestou-se publicamente pela abertura democrática e pela anistia no Brasil.

Indicações para leitura:

De pronto, menciona-se um texto autobiográfico: TEIXEIRA, Pedro Ludovico. Memórias. Goiânia: Liv. Ed. Cultura Goiana, 1973.

Sob o patrocínio do Serviço de Documentação do Estado de Goiás foi elaborada uma coletânea de documentos, comemorativa dos 25 anos de Goiânia, de consulta obrigatória: SABINO JUNIOR, Oscar (org.). Goiânia documentada. São Paulo: Graf. e Ed. Edigraf Ltda, 1958. Um texto específico sobre a construção da nova capital goiana é o de MONTEIRO, Ofélia Sócrates do Nascimento. Como nasceu Goiânia. Goiânia: Líder, 1979.

Uma descrição minuciosa de acontecimentos políticos verificados em Goiás, especialmente nos anos 1930, encontra-se em CÂMARA, Jaime. Os tempos de mudança. Goiânia: Liv. e Ed. Cultura Goiana, 1973. Estudando o mesmo contexto, cita-se a tese de doutoramento de Ana Lúcia da Silva, A Revolução de 30 em Goiás, defendida na Universidade de São Paulo em 1982.

Texto breve e oportuno – “A Revolução de Trinta em Goiás vista por si mesma” – integra trabalho de PALACIN, Luís. Quatro tempos de ideologia em Goiás. Goiânia: Cerne, 1986, p. 81-89.

Um estudo sociológico referente a Goiás, no período entre 1930 e 1945, enfatiza a liderança carismática do fundador de Goiânia: MACHADO, Maria Cristina Teixeira. Pedro Ludovico: um tempo, um carisma, uma história. Goiânia: Cegraf / UFG, 1990.

A coleção “Histórias de Goiás” incluiu entre os seus títulos o trabalho de divulgação de GOMIDE, Cristina Helou. História da transferência da capital. Goiânia: Editora Alternativa, 2003.

Como citar este post:

SILVA, Dinair Andrade da. “Pedro Ludovico Teixeira (1891-1979)”. In: Histórias das Américas. Disponível em: https://historiasdasamericas.com/producao-intelectual/pedro-ludovico-teixeira-1891-1979/. Publicado em: 25/07/2020. Acesso: [informar a data de acesso].