Ginásio Estadual “Assis Chateaubriand” – 1970

Espantalhos, Candido Portinari, 1940.
Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. Acesso em: 29/06/2021.

Mundo afora

A década declinava. [Há controvérsias. Pode-se dizer também que a década seguinte começava.] No entanto, persistia a sua efervescência. Em 1970, os Estados Unidos invadiram Laos e Camboja. Terminava a dramática Guerra da Biafra, na Nigéria. A Líbia tornou-se República, sob a Presidência do Coronel Kadhafi. No Congo, proclamou-se a República Popular.

América Espanhola

Por ela, ainda reverberavam os clamores e as demandas da Revolução Mexicana. No Chile, Salvador Allende, tornou-se o primeiro presidente marxista, eleito democraticamente na América e no mundo.

Mãe Chorando, Candido Portinari, 1944. Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. Acesso em: 29/06/2021.

O Brasil de fora a fora

Sob os auspícios do AI-5, iniciavam-se os anos duros da ditadura. Começavam os tempos do Governo Médici. A repressão recrudesceu de maneira desmesurada.

Também é verdade. O Brasil ganhou o tricampeonato mundial de futebol e o governo soube tirar todo o proveito daquele evento. Veio, em seguida, o “Milagre Econômico”, cujos índices da economia nacional começaram a declinar pouco depois, com a crise mundial do petróleo. E foi criado o slogan: “Brasil, ame-o ou deixe-o”!…

Em Goiás a população cresce

Em 1970, com três milhões de habitantes, o Estado viu a sua população multiplicada por seis, nos últimos cinquenta anos. Este crescimento foi mais expressivo que o crescimento populacional do Brasil e pode ser explicado pela imigração oriunda dos Estados limítrofes.

Goiânia era o meu entorno

Naquele ano, a capital contava com aproximadamente 400 mil habitantes e Anápolis com quase de 100 mil. Recordo que o avanço na urbanização no Estado, não foi acompanhado pelo desenvolvimento industrial, que era de baixíssimo nível técnico.

Gado, Candido Portinari, 1938. Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. Acesso em: 29/06/2021.

Uma escola pública recém-criada

Ginásio Estadual “Assis Chateaubriand”. Ingresso por Concurso Público. O meu contrato de trabalho nesta instituição de ensino, apresenta os seguintes registros funcionais, apontados na Carteira Profissional. A contratante foi a Secretaria da Administração do Estado de Goiás. Natureza do cargo: Professor de Ensino Médio. A data de admissão, 2 de março de 1970; e a da saída, 1º de setembro do mesmo ano. A remuneração especificada era de Cr$ 4,76 por aula efetivamente dada. Ali atuei como professor de Educação Moral e Cívica no 1º Ciclo.

Ministério do Trabalho e Previdência Social. Departamento Nacional de Mão de Obra. Carteira Profissional, nº 53.018, série 227. Goiânia, 17 de fevereiro de 1970. Fonte: arquivo pessoal.

Ministério do Trabalho e Previdência Social. Departamento Nacional de Mão de Obra. Carteira Profissional, nº 53.018, série 227. Goiânia, 17 de fevereiro de 1970. Fonte: arquivo pessoal.

Deslocamento para outra área de ensino

Àquela altura, eu cursava o último ano do Curso de História. Recebi autorização do Ministério da Educação e Cultura, por meio da Seccional do Ensino Secundário em Goiânia, para lecionar História do Brasil e História Geral. A autorização nº 568, datada de 7 de maio de 1970, foi assinada pelo inspetor seccional Galba Otaviano da Silva. Devo assinalar, no entanto, que fui deslocado para outra área de ensino, Educação Moral e Cívica, conforme declarou o Diretor do estabelecimento, posteriormente, em 29 de outubro de 1970.

Autorização ISES – GO nº 568/70, do Ministério da Educação e Cultura, de 7 de maio de 1970, para lecionar História do Brasil e História Geral no 1º Ciclo, no Ginásio Estadual “Assis Chateaubriand”. Fonte: arquivo pessoal.

Declaração do Diretor do Ginásio Estadual “Assis Chateaubriand”, de 29.10.70, que o professor Dinair Andrade da Silva ministrava aulas de Educação Moral e Cívica. Fonte: arquivo pessoal.

Sobre o prédio e as pessoas

Relembro que a instituição possuía, aos meus olhos daquela época, uma enorme estrutura física. Prédio recém-inaugurado. Majestoso. Aqui, um tropeço da memória! Nada me faz lembrar colegas professores. Ou lembranças de alunos. Do Diretor recordo-me: Sebastião França que havia sido meu professor no Liceu de Goiânia. Era fisicamente forte, estatura mediana e moreno. Muito amável e cortês.

Dom Quixote, Candido Portinari, 1961. Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. Acesso em: 29/06/2021.

Ensino inútil

Tenho muito claro na minha mente o valor desprezível do conteúdo das aulas que ministrei aos alunos. Conteúdo de pouco ou nenhum valor. Aulas de Educação Moral e Cívica, para servir ao governo. Nada contra a necessidade de uma adequada reflexão sobre a Moral e o Civismo. Muito pelo contrário!

O desconcertante e lamentável era ter que repetir informações que pouco ou nada contribuiriam para a formação de jovens conscientes. Participativos. Capazes de entender, de raciocinar, de interpretar.

No Ginásio, havia uma coordenação da disciplina, que “zelava” pelas “virtudes” do livro texto, com lealdade ao regime. Que fiscalizava o que se ensinava e como deveria ser cobrado. Cabia ao professor, a repetição. Cabia aos estudantes, a memorização. Nada mais…

O olho, Candido Portinari, 1941. Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. Acesso em: 29/06/2021.

Eu já recebia as avaliações de aprendizagem prontas para serem aplicadas. Guardei algumas, aleatoriamente, que comprovam e documentam minhas reflexões a este respeito. Esta disciplina, como diziam acertadamente, possuía um status diferenciado com relação às demais. E possuía mesmo… Sem sombra de dúvidas!

Ginásio Estadual “Assis Chateaubriand”. Prova Mensal de Educação Moral e Cívica. [1970]. Fonte: arquivo pessoal.

Colégio Estadual “Assis Chateaubriand”. Prova Bimensal de Educação Moral e Cívica. 3ª Série Ginasial “B”. Abril de 1970. Fonte: arquivo pessoal.

Colégio Estadual “Assis Chateaubriand”. Prova Bimensal de Educação Moral e Cívica. 4ª Série “C”, “D”, “E”. [1970]. Fonte: arquivo pessoal.

Colégio Estadual “Assis Chateaubriand”. Cadeira de Educação Moral e Cívica. Prova do mês de maio de 1970. Fonte: arquivo pessoal.

Declaração de rendimentos

Datada de 2 de abril de 1971, assinada pelo Diretor, professor Sebastião França, menciona os vencimentos e demais vantagens auferidos por mim no exercício de 1970, bem como os descontos legais. O rendimento total importou na quantia de Cr$ 771,12. Foi descontada a contribuição ao IPASGO (Instituto de Previdência e Assistência Social do Estado de Goiás), no valor de Cr$38,58.

Declaração do Diretor do Ginásio Estadual “Assis Chateaubriand”, de 02.04.71, sobre os rendimentos auferidos pelo professor Dinair Andrade da Silva, no exercício de 1970. Fonte: arquivo pessoal.

Rescisão contratual numa burocracia sem rumo

Aos 2 de setembro de 1970, encaminhei ofício ao Diretor da instituição, requerendo-lhe conceder-me a rescisão do meu contrato de trabalho.

No final do segundo semestre de 1979, encontrando aquela Carteira de Trabalho, até então extraviada, percebi que a Secretaria da Administração, não havia dado baixa no meu contrato. Fui a Goiânia, requerer que tal procedimento fosse efetuado.

Lá fui informado que a Unidade de Administração do Pessoal da Secretaria de Educação e Cultura, havia efetuado, em 23 de agosto de 1979, uma representação sobre a minha vida funcional junto à Diretoria do Ginásio, por meio do pedido de informação referido no processo nº 1.100.11.647/79.

A Diretoria do Ginásio dirigiu-se à Delegacia Metropolitana de Educação e Cultura, prestou as informações solicitadas e juntou uma cópia do meu ofício de 2 de setembro de 1970, onde se vê uma notação posta à margem: “Pasta do Professor. Goiânia, 2/9/70”, seguida de uma rubrica.

Ofício ao Diretor do Ginásio Estadual “Assis Chateaubriand”, de 2 de setembro de 1970, requerendo a rescisão do meu contrato de trabalho. Fonte: arquivo pessoal.

Informação nº 15/79, de 23.08.79, da Escola Estadual de 1º Grau “Assis Chateaubriand”, dirigida à Delegacia Metropolitana de Educação e Cultura, prestando esclarecimentos. Fonte: arquivo pessoal.

Com certeza, meu pedido de rescisão contratual nunca havia saído de minha pasta, colocada em algum arquivo da secretaria do estabelecimento…

Provavelmente, àquela altura, uma longa década após meu pedido de rescisão contratual, a burocracia goiana, tão cheia de nós e entraves, como as demais, não sabia se eu ainda estava ou não, vinculado ao sistema educacional do Estado…

Espantalho, Candido Portinari, 1947. Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. Acesso em: 29/06/2021.

As imagens artísticas utilizadas para ilustrar este post foram produzidas por Cândido Portinari, pintor, ilustrador e muralista. Nasceu em Brodowski (Brodosqui), SP., em 1903 e faleceu no Rio de Janeiro, em 1962. Modernista, celebrado internacionalmente e no Brasil, retratou o brasileiro e o seu contexto histórico-social.

Este é o quarto post de uma série de registros de minhas lembranças dos meus primeiros encontros com a docência que ocorreram entre os anos de 1968 e 1971, em Goiânia.

Como citar este post: SILVA, Dinair Andrade da. Soou a sirene… As aulas vão começar! Lembrança 4 – Ginásio Estadual “Assis Chateaubriand” – 1970. In: Histórias das Américas. Disponível em: https://historiasdasamericas.com/soou-a-sirene-as-aulas-vao-comecar-lembranca-4/. Publicado em: 29/06/2021. Acesso: [informar a data de acesso].